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Porque não votarei em nenhum rapper nessas eleições. Por Toni C



TEXTO ORIGINALMENTE PUBLICADO NO https://literarua.wordpress.com/

Se o policial elege um policial para representa-lo, o evangélico elege um evangélico, o ruralista elege sua bancada, e nós?


Por Toni C.
“Fiquei sabendo tem um tal de Pepeu”. Antes de falar sobre o lendário rapper pioneiro ao gravar o primeiro disco do gênero no Brasil e que agora disputa uma vaga na vereança da capital Paulista, quero contar uma história menos conhecida, a do Claudinei.
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Claudinei era um garoto como eu, pobre morador da esquecida cidade de Carapicuíba. Pobre em termos financeiros, era rico, milionário de sonhos, sorrisos, esperanças e vontade de melhorar sua vida e de quem se metesse ao seu redor, assim como a Andreia, Gilson, André. Todos jovens de 14 anos de idade que tive o privilégio de conhecer nos tempos do grêmio da escola. Eu, Luciano, Amaro, Ricardo Cacá, João Paulo, João Ricardo fazíamos parte da “velha guarda” e andávamos quilômetros a pé nas ruas íngremes de Caracas mascando teoria como se fossem chiclete e com a revolução pulsando forte no meio do peito, íamos recrutando essa molecada para assumir nosso postos, para que nós assumíssemos também outras trincheiras.
Era época de eleições municipais, como as que agora se avizinham. Convocamos os mais novos para se juntar a nós e ao nosso projeto e lançamos, como quem lança o Sputinik  ao espaço, o nome do camarada Ricardo Cacá como candidato a vereador na cidade. Nossas madrugadas eram em cima dos postes prendendo placas, colando cartazes, pintando muros, de dia reuniões, planfetagens e planejamento para a próxima noite.
Tudo isso a gente fazia sem dinheiro. Esse fator foi decisivo, o dinheiro. Candidaturas bem mais abastadas na cidade comprava tudo, até voto. Assim perdemos os meninos afinal quem guenta quando dentro de casa sobra desempregados e falta algo na geladeira pra comer? A derrota do nosso candidato quando as urnas foram abertas não foi nossa maior tristeza.
O drama veio de uma viela escura, um escadão em que Claudinei caminhava voltando de uma atividade política às véspera da votação. Um acerto de quadrilhas pegou Claudinei em cheio, ele foi atingido por tiros dos dois lados, ao todo quatro projeteis perfuraram seu corpo, o resgate demorou a acontecer e demoramos para ter maiores notícias sobre ele.
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Dias depois, fora da UTI, fora do hospital, visitei Claudinei em recuperação já em sua casa. Tinha a fala, os movimentos, a alegria e a moral abalada, sem ânimo para fisioterapia. Não entendia, como pôde ter um destino tão cruel, se ele só agia para o bem? Não entendia porque seguia com vida, já que estava condenado a sobreviver com seque-las. Invejava o Edgard, outro parceiro nosso também vítima da violência estúpida do qual não sobreviveu.
Quem diria, três eleições depois Claudinei é candidato a vereador para corrigir os problemas no mesmo município que o vitimou. Ele me diz: “Entrei nessa por ódio, com raiva, nunca quis” entrou para se vingar dos que acharam que iria por um ponto final nesse menino cheio de reticências… e em pleno jogos paralímpicos Claudinei planeja se eleito criar políticas públicas aos portadores de deficiência. Rebaixar, somente as guias nas ruas, a cabeça, jamais!
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Ainda assim, Claudinei é o primeiro da minha lista, dos candidatos do qual não votarei.
Anderson Hot Black é um cabrunco da peste, meu irmão em Aracajú, líder do grupo Mensagenegra lá do nordeste. Sua campanha é embaçada, rapper, frestyleiro, apresentador de programa de rádio e TV, estrategista, skatista pai de Nathalia e Adan. Vai ser prefeito dessa cidade um dia, escreve o que eu estou falando, ou melhor, leia o que estou escrevendo. Mas em Hot Black, também não votarei, minha lista de não candidatos segue.
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O xará de Hot é o Anderson 4P guerreiro na desoladora cidade de Francisco Morato, pior IDH de São Paulo. 4P é hoje um dos raros casos de um rapper ocupando o espaço público, eleito e reeleito vereador é um dos mais atuantes e consequentemente mais bem avaliado da cidade foi trancafiado num esquema criminoso que rendeu a ele uma prisão de quase um ano, com objetivo de retira-lo da vida pública. Deu ruim, voltou duas vezes mais safo, agora se candidata para seu quarto mandato. Não votei nele das outras vezes e este ano é mais um em quem não irei votar nele novamente.
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Sharylaine é o nome da guerreira de atitude que infelizmente também não votarei. Se não bastasse ser mulher, negra, moradora de periferia, foi fundadora simplesmente do primeiro grupo de rap composto só de mulheres, isso em 1986, quem tava lá? Se isso não é prova de bravura, não sei o que seria num mundo machista, onde homens saquearam por 500 anos nosso país e destituíram a primeira mulher a ocupar a presidência da república. Votar em Sharylaine é um ato de coragem. Quero ver você me dar quatro nomes de meninas candidatas que tenham a trajetória e garra da Laine.
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E assim poderia seguir até amanhã, listando, os diversos candidatos do rap Brasil a fora que não votarei nessas eleições: Pepeu, Douglas Realidade, Rebeld SNJ, Raissuli, Fabio Corvo, Tizyl, DJ Fox, André Bolinha, Henry, Karluz, Festa, Gabriel, Ted Rap, Anne, Sagaz, Leo, DaSilva, Marcuz Sanchez, Dr Paulo, entre diversas outros guerreiros.
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Considero extremamente valioso as manas e manos do nosso meio colocando seu nome, seu corre  à disposição para disputar uma vaga nestas eleições. Gosto de pensar que a Nação Hip-Hop e eu também de alguma forma contribuí com isso, lá trás quando ninguém acreditava, tomando pedrada apoiando candidatos como Aliado G e Nuno Mendes, esses são os frutos.
Tenho pelo menos dois bons motivos para pedir o voto para estas pessoas da qual eu não votarei:
Primeiro, são pessoas que vieram da periferia, oriundas do nosso movimento, que tem nossa visão e do qual sabemos o nome e o corre, assim poderemos cobrar sempre que necessário.
Segundo colocando um dos nossos lá, mesmo que não faça nada, absolutamente nada de positivo, já estará prestando um grande favor em ocupar uma cadeira destinada pra algum pilantra que só atrasa a quebrada há gerações.
Então, se é assim porque eu mesmo não votarei nesses candidatos? Muitos desses que apresentei acima não poderei votar por uma questão geográfica, são candidatos em outras cidades. Em uma campanha precisamos olhar para o candidato, seu perfil, suas propostas e para o grupo político para o qual pede voto.
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Se o policial elege um policial para representa-lo, o evangélico elege um evangélico, o ruralista elege sua bancada, e nós? Até quando vamos cantar contra o sistema  e se calar no momento de ter um representante no parlamento?
Por isso, por mais limitado que seja o corporativismo, é melhor que o individualismo. Podem me chamar de corporativista, sou escritor periférico, sou comunista, meu voto será dado para um novo camarada de sigla e velho parceiro de escrita, Alessandro Buzo, de tantas estradas, vários saraus, debates, conflitos e várias lidas.
Faça o mesmo, não vote em mim, não vote em meu candidato, vote você também em um igual a você mané.
#ForaTemer em tempos de eleição é votar em gente da gente pra mudar a política por inteiro.

TONI C a esquerda e ALESSANDRO BUZZO a direita* Autor dos livros: Sabotage – Um Bom Lugar, e do romance “O Hip-Hop Está Morto”, integrante do Conselho Nacional de Cultura na área de Livro, Leitura e Literatura, membro da direção da Nação Hip-Hop Brasil, diretor de cultura da ORPAS,  integrante do Portal Vermelho e criador do coletivo LiteraRUA.

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