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Kamau e Emicida falam sobre os Clássicos

Na correria

Por Ramiro Zwetsch
Fotos: Zé Gabriel

Kamau lançou o melhor disco de rap brasileiro do ano passado, "Non Ducor Duco". Emicida lançou a melhor música, "Triunfo". A correria é a estratégia de marketing para ambos: vendem discos de mão em mão, negociam lotes com as lojas das grandes galerias do centro paulistano, distribuem flyers dos shows e fazem o escambau para suas músicas atingerem cada vez mais ouvidos.

Figura onipresente na cena hip hop há muitos anos, Kamau participou ou participa de uma tonelada de projetos (Instituto, Simples, Academia Brasileira de Rima, Consequência, Quinto Andar...). Todo seu potencial, no entanto, só apareceu com seu elogiado e primeiro disco-solo. "Non Ducor Duco" vendeu mais de 2 mil discos a R$ 15 e os lotes esgotaram rapidamente, muito além do calculado inicialmente. Em 2008, ganhou o prêmio Hutuz pela música "Poesia de Concreto" – curiosamente, lançada alguns anos antes de todo repertório inédito do seu disco de estréia

Emicida já tem sua estrada, mas apareceu há menos tempo. "Triunfo" estourou nas baladas e chamou mais atenção para seu trabalho. Em maio, botou nas ruas a mixtape "Pra Quem Mordeu Cachorro Por Comida, Até Que Eu Cheguei Longe", uma colagem de músicas produzidas por ele até então. Sem gravadora, queimou um monte de CDRs, carimbou arte e texto de encarte em cada capinha de papel, numerou todos os discos e botou debaixo do braço. Neste esquema, vendeu mais de três mil cópias, a R$ 2.

Ambos fizeram escola nas batalhas de freestyle e são reconhecidos como alguns dos melhores improvisadores do Brasil – embora nem um nem outro participe das disputas com a mesma frequencia de outros tempos. Há rumores de que a química entre eles é incendiária no palco. E, neste sábado (01/08), eles se apresentam juntos para interpretar um repertório só de clássicos do hip hop, escoltados pelo DJ Erick Jay. Biz Markie ("Just a Friend"), Black Juniors ("Mas Que Lindas Estás"), Racionais ("Voz Ativa"), Thaíde e DJ Hum ("Corpo Fechado"), Pharcyde ("Runnin'") e Pepeu ("Nomes de Meninas") estão no set list. O cenário é propício para uma noite extramente agradável. Na correria, entre ensaios e mudança de casa (no caso de Emicida), eles responderam algumas perguntas por email. Ficou assim:

Como surgiu a idéia deste show, só com clássicos?
Kamau: a ideia inicial do Zeca (da rádio boomshot, que está promovendo o show) era que eu cantasse uns sons do A Tribe Called Quest, que é um grupo que gosto muito. Mas eu teria que arrumar um MC pra fazer as partes do Phife. Pensando em nomes, ele sugeriu o Emicida e falou: "ele podia cantar umas do Pepeu". Aí vimos que dava pra expandir a parada e chegamos nessa ideia dos clássicos, só com músicas que marcaram pra gente.

O que faz de uma música um clássico?
Kamau:
eu estava pensando nisso, ouvindo as músicas. Acho que o fato de a música atravessar os tempos soando como nova toda vez, faz dela um clássico. Até quem não conhece escuta como se tivesse sido lançada ontem. Não é aquela parada de saudosismo, de flashback, sabe? "What a Wonderful World" (Louis Amstrong) é um clássico, "Unforgettable" (Nat King Cole) é um clássico, "Fight the Power" (Public Enemy) é um clássico, "Runnin'" (Pharcyde) é um clássico. "Runnin'" toca há 14 anos nas baladas de rap e parece que ganha força a cada dia.

Teve algum rap brasileiro, em especial, que mexeu com você a ponto de pensar "é isso que eu quero fazer da vida"?
Kamau:
vários raps brasileiros marcaram minha vida. Mas eu só comecei a pensar que eu poderia fazer isso da vida quando alguém me perguntou: por que você não rima? Mas toda vez que saía uma do Racionais ou do DMN eu cantava como se fossem minhas, como se eu tivesse escrito.
Emicida: "Nomes de "Menina" (Pepeu), "O Homem na Estrada" (Racionais), "Sonho Meu" (Xis)... Tem tantos, se eu for listar num cabe...

Quais foram os critérios para escolha do repertório?
Kamau: resolvemos cantar as músicas que a gente lembrava ou as que realmente fizeram diferença na nossa vida. Simples assim.
Emicida:
músicas com as quais nos identificamos há quase 20 anos e que marcaram nossa existência de alguma forma.

Vocês já se apresentaram juntos em um festival da Boomshot, em dezembro do ano passado. Quais são suas lembranças daquele show?
Kamau:
foi um show cabuloso. A gente sempre se apresenta junto, mesmo quando não é show anunciado como "Kamau e Emicida". O Emicida não gosta muito de alguém ajudando no vocal porque ele é Lobo Solitário. Mas sempre quer chegar comigo nos sons quando está junto. E eu acho isso da hora. E sempre invado o show, mesmo quando não solicitado ou autorizado.
Emicida: arregaçamos!!

Pessoas que viram o show dizem que a sintonia entre vocês é algo surpreendente. Vocês pensam em gravar um disco juntos ou fazer algum outro projeto em parceria?
Kamau:
com certeza faremos mais música juntos. Mas um disco é um passo muito maior, tem que ser muito bem pensado. E estamos no começo ainda. Várias coisas tem que acontecer pra cada um.
Emicida: eu penso em tanta coisa, cara. Gravar um disco com Kamau não está fora disso, por que não? A gente tem uma sintonia bem legal mesmo, difícil de ver... Vai da convivência, né? A gente se vê quase todo dia, treta, discorda, ri, vai pros mesmos locais... Eu gostaria de ouvir esse disco, mas num tô prometendo nada... Ainda.

Vocês divulgam o trabalho e vendem discos na correria, de mão em mão. Esta é a melhor saída para o rap, atualmente?
Kamau:
não sei se é a melhor saída. Mas pra nós é a única saída. Faço isso desde 2002 com o EP do Consequência. Aprendi com meus amigos que fazem rock independente. Quero poder me preocupar menos com isso e poder me focar na música. Mas também quero saber se a música está realmente chegando até as pessoas. Eu não diria que tenho um público-alvo, mas sei que gostaria que minha música atingisse o maior número de pessoas possível.
Emicida: só existe essa saída. Na verdade, nem é uma saída, essa é a entrada...


"Triunfo" já pode ser considerada um clássico?
Kamau: acho que é bem recente. É um hino, uma música bem forte pra mim. Mas clássico é um título que vem com o tempo.
Emicida: deixemos que as pessoas digam daqui a alguns anos. Um clássico nasce quando ele toca, injeta uma vida nova na parada, um gás que faz os irmãos voltarem a ter 15 anos, cantar como se fosse o último show da vida deles, essas coisas... Agradeço ao Felipe Vassao em todas as minhas orações por esse instrumental... Acho que conseguimos fazer isso devido ao momento, à base, à mensagem, à intenção... O rap precisava disso, mas precisamos de mais clássicos agora... O Kamau trouxe uns no disco dele e o Marechal está trabalhando igual doido lá no Rio também... Teremos mais disso em breve...

Qual é a importância das batalhas de freestyle no seu estilo de rimar?
Kamau: a convicção em cada rima dita. Olhar no olho das pessoas do público certo do que estou fazendo. Se eu não acreditar no que digo, ninguém vai sequer dar atenção.
Emicida: a evolução vem disso, as informações circulam pela nossa mente, fazem a gente se manter jovem... (risos)

Olhando para trás, já que estamos falando de um show de clássicos, você acha que o rap avançou, retrocedeu ou estagnou? Por quê?
Kamau: o rap avançou em vários aspectos, inegavelmente. Mas ficamos de lado com essa queda da indústria. Isso nos fez mais fortes e estamos erguendo uma estrutura sólida, pra durar. Nada de castelo de areia. Pra mim é sempre uma vitória quando alguém diz que "nem gostava de rap mas gostei do seu som" ou "até minha vó, meu pai gostam do seu som". Essa é a maior prova de que o rap é música, pois a música é o que atinge as pessoas dessa forma.
Emicida: avançamos, alcançamos várias coisas, ganhamos várias batalhas. Mas precisamos de muito mais Kamaus, Emicidas, Slim Rimografias, KL Jays, pra fazer com que cada vez tenhamos mais motivos pra comemorar...

"Non Ducor Duco" é considerado por muita gente o melhor disco de rap de 2008. Como você reage a esta opinião?
Kamau:
fico feliz pelo reconhecimento do trabalho. Nunca comparei meu disco ao disco de ninguém. E 2008 já foi, e o disco continua aqui. A música continua. Isso pra mim é melhor ainda.
Emicida: eu concordo. Estou pra ver algo que chegue perto do que ele fez ano passado. Trabalhou direito, merece todo o mérito pela conquista. Ficar entre os 25 maiores discos escolhidos pela (revista) Rolling Stone é pra poucos... Fico feliz por ter participado do trampo.

E, sinceramente, não é meio estranho para você ganhar o prêmio de "melhor música" no Hutuz com "Poesia de Concreto" (que é uma música que já tem uns cinco anos ou mais), sendo que você tinha acabado de lançar um disco de repertório inédito?
Kamau: o público lembrou da música. Não sei qual foi o critério pra escolha. Mas a ironia do destino fez com que essa letra ganhasse mais força. Eu falei sobre o fato de a música ser antiga quando fui agradecer pelo prêmio. Era o que eu menos imaginei ganhar. E ela sempre é pedida nos shows. Acho que tem uma razão que eu desconheço, mas o tempo se encarrega de explicar.
Emicida: boa pergunta, também já fiz essa...

O que o público pode esperar do show? Podem adiantar algumas faixas do repertório?
Kamau: espero que vocês se divirtam e nós também. O repertório é só pra quem for mesmo. Heheheheh.
Emicida: clássicos, compareçam...

Kamau e Emicida
Quando:
sábado, 01/08, a partir das 23h30
Quanto: R$ 12 (com flyer) ou R$ 15 (sem flyer) para homens; vip até meia-noite, R$ 10 (com flyer) ou R$ 12 (sem flyer) para mulheres.
Onde: Hole, R. Augusta, 2203
Discotecagem: Roger, Makô, Marco
MC: Tuchê


By RadiolaUrbana

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