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Novo CD marcou retorno de grupo de rap perseguido pela PM nos anos 90

O grupo de rap Consciência Humana começou a ganhar destaque em 1991, com suas letras focadas, principalmente, na violência do Estado – que se intensificou nas periferias após a ditadura civil-militar (1964-1985). Foi nesse contexto que surgiu a música Tá na Hora, que retrata os assassinatos cometidos por policiais da Ronda Ostensiva Tobias de Aguiar (Rota).
A canção, baseada em fatos reais, menciona nomes de militares bastante conhecidos em bairros periféricos como São Mateus (ZL), lugar de origem dos rappers. Um deles é o Cabo Bruno, que participava do chamado “Esquadrão da Morte” e foi apontado como responsável por pelo menos 50 homicídios. O ex-chefe da Rota e hoje vereador na cidade de São Paulo Conte Lopes (PTB) também foi confrontado na música.
O Consciência Humana criou uma forte identidade com São Mateus. Na música Lei da Periferia, o grupo relata os principais problemas enfrentados cotidianamente pelos moradores. Preto Aplick, integrante do grupo, relata que as músicas foram importantes para criar uma sensação de pertencimento nas pessoas que viviam no bairro.
“Os jornais só falavam mal de São Mateus. Não saía um artista, um atleta lá de dentro, só saía bandido, coisas ruins. De repente, vem um artista, um grupo de rap falando desses problemas todos. A população de São Mateus acatou nossas palavras e isso significou muito pra gente.”
A reportagem da Radioagência NP foi até o bairro de Itaquera (SP) onde fica localizado o estúdio Só Monstro Produções, pertencente ao grupo. Após dez anos sem gravar, o Consciência Humana prepara o novo CD Firma Forte, que marcará uma nova etapa na carreira do conjunto. Neste ano eles completam 22 anos de existência.
Perseguições
Com a Rota nas ruas das periferias o terror foi inevitável. Criada na década de 1970 com o objetivo de manter a ordem vigente dos militares, a atuação da corporação deixou lembranças traumáticas. O músico Aplick tem um arsenal de recordações.
“Nós vivíamos correndo deles. Aí escrevi a primeira música que se chama Terror em São Paulo. A partir dessa daí já tava trazendo as ideias de quem convivia com esses caras na madrugada. Passei parte da minha vida na rua. Então eu bati de frente com eles. Então viemos escrevendo essa história. No meio dessa música pra lá, eu encontrei o Conte Lopes. Ele invadia os barracos, deu tiro na boca do meu tio. Foi aí que veio essa música Tá na hora.”
Conte Lopes declara guerra
Depois que a música foi parar nas rádios com uma forte audiência, o Consciência Humana foi entrevistado pelo jornal Notícias Populares. O grupo relatou as perseguições e matanças por parte dos grupos de extermínio formado por policias militares.
O jornal deu destaque às chacinas que, segundo os moradores de São Mateus, eram comandadas pelo então chefe da Rota, Conte Lopes. O policial, no entanto, se defendeu das acusações e chegou a ameaçar os integrantes do grupo.
Na introdução de outra música intitulada Rato cinza canalha, aparece uma gravação de Conte Lopes dizendo “escuta aí periquito, é o Magnus do capitão Conte Lopes [...] esse é o Magnão bonito que o periquito gosta”, se referindo aos cantores. Aplick revela que as perseguições aumentaram desde então.
“No NP [Notícias Populares] ele pediu pra que a gente parasse de cantar essa música nos shows, porque a gente ia ter problema. Aí a gente continuou cantando essa música. Não paramos. Aí a Rota começou a encostar nos shows. Chegava nos shows os caras falavam ‘vocês não vão cantar essa música’. Eles ficavam na frente do palco e não queria que a gente cantasse”.
Para WGI, também integrante do Consciência Humana, a postura intransigente no palco influenciou a conjuntura política.
“Nessa época, o Conte Lopes tava se candidatando a deputado, e a gente conseguiu fazer com que ele perdesse voto em São Mateus”,
Novo CD
Depois de dez anos sem gravar, o Consciência Humana trabalhando no seu novo álbum, “Firma Forte”, que deve ser lançado em maio deste ano. Com participações de renomados rappers, o grupo promete lançar novas ideias, mas mantendo os mesmos princípios.
“Enquanto tiver injustiça e violência policial, a gente vai tá lá, tio. No dia que isso daí acabar, a gente para de falar disso.”
De São Paulo, para Radioagência NP, José Francisco Neto.

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