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“Como é que você nunca ouviu falar, nos bruxos lendários do norte?”

“Como é que você nunca ouviu falar, nos bruxos lendários do norte?”
               Por Ana Calheiro e colaboração de Victor Augusto

Pra todo amante do rap nacional, mesmo que hoje curta um estilo diferente, em algum momento da vida já teve contato com o rap através do Gangsta Rap ou o “Rap de mensagem”, como gostam de chamar. Nesse contexto, existe a dicotomia de pensamento,entre aqueles que só consideram rap como sendo verdade nesse estilo de crítica explícita ao “sistema”, e os que criticam criticam o estilo, por ser um ataque sem rumo, sem inovar na tão importante “mensagem”.



Clã Nordestino - A Peste Negra do Nordeste (Álbum)
Considerando essa dualidade de idéias, identifico um dos melhores grupos que eu considero na história nacional, Clã Nordestino. O álbum A Peste Negra do Nordeste, deveria ter mesmo o status de clássicos tão respeitados por nós. Aqui do sudeste  As rimas fortes que tratam a realidade da periferia no Maranhão, com a identificação do recorte de classe e a insatisfação com a burguesia, o álbum é uma pesada produção explícita do povo para o povo, apresentando ideias pontuais sobre as vivências e problemas, sem fugir de apontar as soluções. No corre desde 1998, Clã Nordestino nos mostra que a cena no nordeste ferve há muito tempo, porém atualmente, está em ebulição, se destacando no quesito adesão do público, letras e tudo mais que tem mostrado todo o fervor do corre independente do Rap Nordeste. 

Baco Exu do Blues e Diomedes Chinascki


Durante alguns dias consegui conversar com algumas pessoas envolvidas com o Rap Nordestino de alguma forma, e também com alguns amigos do interior de São Paulo, pra destacar algumas visões. Esse texto não é uma entrevista, não é para recortar a fala fielmente e colar aqui, essa troca de idéia tem que ser pessoal com a galera, digo por mim mesma, que é uma grande experiência ir buscar mais sobre a cena nordestina, são diversas experiências e histórias. Desde já queria agradecer aos que deram um tempinho pra mim e contribuíram com a troca de ideias, o Recém Chegado MC da Bahia, o Snow do grupo Os Crias, e que compõe a banca Fortal La Máfia no Ceará, o Pajé do grupo Ibura Bagdá do Pernambuco, e também o Marcola, organizador da batalha do Castelinho, e o Arthur, organizador da batalha do Coreto e também integrante da Produtora 2Face, ambos também do Pernambuco.
O trecho que dá título a esse texto, da tão incômoda Sulícidio de Baco Exu do Blues e Diomedes Chinaski, ecoa forte na cabeça mesmo pra quem não gostou do som. O grito desses dois rappers faz todo o sentido quando pensamos na questão de consumo musical, que até uns anos atrás era monopolizado no eixo Rio-São Paulo. Isso se explica por alguns motivos, mas o principal é o paradigma social. Os gostos e costumes impostos pelo estereótipo do nordestino, são uma estratégia de reduzir toda a diversidade do povo, a alguma característica apenas. Pensando musicalmente, essa estratégia acaba se tornando um boicote a toda produção musical que fugir ao estereotipado  para o Nordeste, como por exemplo o Rap. 
Sulícidio é entendido por todos como pontual e importante pro destaque da cena do nordeste, mesmo não sendo o estilo do corre de alguns, é fácil notar a reação em cadeia na visibilidade do som, que com certeza movimentou todo o rap nacional. Como me disse um amigo, “Baco e Diomedes são só a ponta do iceberg,pra despontar dois caras assim, com certeza existe todo um pano de fundo gigante, uma cena, trabalhando e produzindo”. 
Fazendo uma analogia barata, sabe quando desfia um pano que você gosta, e você puxa a linha e vem um monte de linha na sua mão? É isso, só que nesse caso a idéia é puxar mais e mais.  Troquei idéia com 5 caras, e é incrível como as histórias se assemelham, a forma como o Rap envolve e edifica a vida de cada um. Pra quem bate tanto na tecla de viver o que canta, a cena nordestina é o canal. 

D'rua - Maloka, mc da Batalha do Castelinho - PE

Batalha do Castelinho, em Recife, surgiu como forma de protesto e de grito em resposta a ação do governo de desabitar e demolir prédios habitados. A Batalha tem cerca de um ano, e o organizador Marcola conta que mesmo recente, foi possível ver a evolução da primeira edição, as de hoje; a levada dos mc's, as rimas, além de ter aberto porta pra vários grupos locais, e a visibilidade dos grupos da própria comunidade que ninguém sabia que existia. Pertinho de Recife, Jaboatão dos Guararapes, ou JG City, também tem a Batalha do Coreto, que começou a se movimentar, na vontade do Mc Raí Dread de levar o Rap pra quebrada. Imerso no ambiente da batalha há 2 anos, Arthur que hoje é produtor de imagens da batalha e também dos mc's Raí Dread e THC, comenta sobre sua própria evolução pessoal ao analisar a cena local do Rap. Antigamente pelas próprias palavras dele "ninguém levava a sério quando qualquer um  de nós chegava pra mostrar os trampos, depois que comecei a estudar jornalismo, ampliei a visão, vi que a cena exige profissionalismo", e nessa busca pelo profissional, Arthur se juntou com o DJ Drop3D e criaram a produtora 2Face. Hoje considera que esse trampo conseguiu inserir o grupo no mercado e aprimorar o trabalho dos mc's que trabalham.  

Raí Dread & THC x PinguiN - $UJX, mc`s da Batalha do Coreto - PE
Ainda passeando na cena de Pernambuco, conheci o grupo Ibura-Bagdá, o nome do grupo foi uma música feita pelo rapper Rafael Couto, pra homenagear o bairro onde mora, o som tomou uma proporção muito grande, e acabou se tornando um grupo. Conversei com o Pajé, que hoje faz parte do grupo, sobre a visão dele de como o Rap tem caminhado em Pernambuco. Pela experiência dele próprio, que via apenas a cena de longe, não percebia um grupo local que chamasse a atenção da comunidade, sempre eram os sons clássicos de São Paulo e Rio de Janeiro que estavam presentes nos espaços; porém viu recentemente o surgimento de vários grupos e estilos no Rap Pernambucano, além dos beatmakers e estúdios de qualidade, que hoje alimentam a quantidade de mc's e grupos recém formados.  

PaJé - Crônicas (prod Ereg), grupo Ibura Bagdá
Conversando com essa rapaziada do corre no Pernambuco, percebi como o fortalecimento local é importante. É muito legal ver como eles, mesmo em estilos diferentes, se fortalecem, divulgam o corre dos outros, consomem muito o que é produzido deles pra eles. Isso reflete no público geral, progressivamente o sotaque paulista e carioca que ecoava nos beats, é tomado pelo jogo de rima embolada e speedflow natural nordestino. 
O "nós por nós" não se limita ao rap local da cidade ou do estado; trocando idéia com o Snow, do grupo Os Cria do Ceará, ele destaca vários trabalhos pesados do pessoal, relata que coletivamente o nordeste tem se fortalecido e que as dificuldades de contratos e retorno monetário que pega pra todos, não impede o trabalho sério do pessoal. Snow é um dos mais novos, mas com muita idéia pra mostrar. Na cena do rap desde 2012, já rimava em rinhas de funk quando mais novo. O som pesado do grupo Os crias, quando ouvido em meio a cena crescente do trap, dá aquela sensaçào de que o rap crime vive, e é muito bem alimentado lá no Ceará. O lançamento recente intitulado Frieza, mostra a qualidade dos sons, daqueles que a galera exprime um "Máximo respeito!" depois de ouvir. 

Snow flm - Frieza (O.S.C.R.I.A)
Referenciando o album que eu mais gosto, que o corre nordestino continue a invadir a cena nacional, sendo uma verdadeira Peste Negra do Nordeste, incontrolável, tomando todos os espaços e contaminando com as idéias pesadas. Aproveitando o fortalecimento coletivo da galera que conversei, perguntei o que eles estavam ouvindo ultimamente, e olha a mãezona que sou, vou até deixar uma lista de indicações deles próprios com alguns sons que ouvi e me instigou a ouvir mais. 
Vale a pena descobrir o mundo do rap no nordeste, buscar, conhecer, ouvir, consumir, façam o E.T bilu do rap, busquem o conhecimento da cena nacional!

Áurea Semiseria - Áurea Abolicionista (BA)



Dinexo , Junior MC , Recém Chegado - O Clã (BA)

Camila Rocha - Nada de Novo [part. Issa Paz][beat.ATNbeats] (PB)



Flip R1 - Abatendo a Meta (Prod.Primordio) (PE)

LADY LAAY - Subversão Feminina [Prod. DJ Novato](PE)

Opanijé - Se Diz (BA)

Pinguin - Infector (PE)

Planeta Mafia x Biggie N - "Lugares" (Prod.Primordio) (PE)

NSC - Sexta feira 13 [Ft. Rimador] (AL)
É isso!

Notas da Ana pra vocês:
* O norte e o nordeste são duas regiões distintas, uso o termo norte no título não generalizando, mas é fazendo menção ao som e a questão de que em relação ao sudeste, o nordeste está ao norte hehehehhe.
** São só algumas indicações, a cena é grande, e vão ficar vários de fora infelizmente. Vão procurar sobre a cena, procurem grupos, entrem em contato, troquem idéias. É uma troca de vivências extremamente importante que tem muito a acrescentar.
*** Perdoem os erros, relevem os equívocos, e qualquer coisa, chama na caixinha que a gente resolve.

Sobre os autores


Ana Calheiro: Não é jornalista, nem blogueira, só uma amante do rap que gosta de falar bastante.
Victor Augusto: Guto é DJ no selo independente Carranca Records.  

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1 Comentários

  1. Gostei muito da visão dos autores do texto, eu, particularmente, desconhecia o cenário do rap no nordeste brasileiro. O eixo Rio-São Paulo realmente centraliza o cenário brasileiro,e,de fato, é muito importante o crescimento do rap fora do sudeste, isso mostra a força que o rap nacional possui como estímulo para mudança social e no enriquecimento cultural. além disso, o rap nacional mostra que está, cada vez, mais forte dentro do seio da sociedade brasileira, incorporando todas as regiões do país. Parabenizo o esforço e a dedicação dos colabradores dessa pesquisa Victor Augusto e, em especial, Ana Calheiro a qual admiro, não só pela beleza, mas, também, pela paixão que ela emprega para o florescimento e desenvolvimento do rap nacional como mudança de coerção social.

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