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#ReferênciAna - AFROCYPHER vol. II

Novidades no blog, o #ReferênciAna, assim como explica o nome, nessa seção do NP, você vai encontrar algumas de minhas percepções e discussões sobre referências históricas e sociais utilizadas em letras de músicas. 

#ReferênciAna - AFROCYPHER Vol. II



Pra inaugurar a seção, escolhi um Cypher, que inclusive já mostramos aqui no NP. E que particularmente, eu Ana, gosto muito e acho cheio de referências espetaculares. Afrocypher vol. II (Ouçam o vol. I aqui, é muito bom também). O cypher conta com os artistas Rhenan Duarte, PeqnoH Robson, Underson Leitty, Daniel Garnet e Rodrigo Buga. 

Vou discutir sobre as referências com cunho histórico e social que eu percebi utilizadas nos versos de cada rapper, lembrando que são minhas percepções como ouvinte, pode não ser a intenção real do rapper. 
Vocês podem conferir a letra completa do som aqui, enquanto assistem ao clipe:

              


O primeiro rapper a mandar suas rimas é o Rhenan Duarte. Rhenan começa o som com o dedo na ferida, o que acontece o som inteiro na verdade. Citando as cores de Deus e Jesus, Rhenan ao meu ver, coloca a questão da maioria das representações das divindades cristãs serem colocadas como homens brancos no padrão eurocêntrico, Renan faz então o paralelo entre a vida de Jesus contada e o que se aproxima mais da imagem dele. Em seguida, ele comenta sobre a questão do Brasil e da cidade de Campinas, segundo pesquisa serem os últimos registros de abolir a escravidão e não deixa de pontuar a questão da solidão da mulher negra, temos esse artigo de duas mulheres negras, uma delas inclusive formada pela Universidade de Campinas. Rhenan continua suas rimas falando sobre algumas situações diárias de racismo implícito em falas e atitudes. Um amigo negro não te fará negro, então não adianta praticar racismo com a barricada do "eu não sou racista, tenho até amigos negros" porque isso não isenta ninguém.


Peqnoh começa sua parte no cypher chamando o ouvinte pra observar algumas coisas explícitas a própria volta que evidenciam o racismo, como por exemplo o racismo institucional, presente nas falas 'barrado numa vaga de emprego por sua aparência não corresponder'. Também a questão colocada sobre onde estão em destaque os pretos? Se somos o país com mais de 50% negros, como é possível nas posições de representatividade do povo não haverem muitos representantes? No verso seguinte, Peqnoh contextualiza a situação do Rap atualmente, onde muitas pessoas que curtem e fazem parte do Rap, são o estereótipo das pessoas que a pouco tempo criticavam o estilo musical. Exemplo que ele evidencia na próxima rima, quando ele diz que o Rap vai voltar a ser mais preto, se refere ao fato do 'boom' de rappers brancos com visibilidade na cena atual. Posterior a falar sobre o rap voltar a ser mais preto, Peqnoh ironiza o racismo reverso que algumas pessoas tentaram plantar, e exalta a posição dos brancos que reconhecem a história e sabem que não é uma questão de racismo reverso (que inclusive não existe), mas uma questão de história da música, respeitar a própria história do Rap que anda junto com a luta e representatividade negra. 
Por último, ele faz referência ao clássico "hino" de todo jovem negro, Negro Drama é a expressão máxima de falar de você mesmo no tempo verbal "sou foda". Então pra todos que esperavam mais um cypher sem qualidade e limitado, os caras chegaram pique clássico!

Underson Leitty vem com os dois pés na porta. O rapper inicia suas rimas fazendo menção a liberdade de corpo e alma, sem os elementos que caracterizavam a privação de liberdade na época da escravidão. Ele referencia como capitão do mato, o vereador negro Fernando Holiday, conhecido pelos seus discursos anti forma de luta do movimento negro e acusação de coitadismo dos negros. A figura dos capitães do mato surgiu na sociedade após a destruição do Quilombo dos Palmares, os empregados, negros, eram pagos pelos senhores para prender negros escravizados que haviam fugido. Traçando o paralelo, Holiday faz discurso, guardada as proporções, contra seu próprio semelhante, agradando assim aos 'senhores', ele apenas se esquece, que quem fica nesse muro, acaba tomando pedrada dos dois lados. O rapper traz ainda a questão da justiça brasileira, que pesa a questão racial de forma desigual e pontual. Mesmo pedindo mayday, socorro nada é dado. Underson menciona o homicídio com 111 tiros, dos 5 garotos no Rio de Janeiro, onde ninguém foi punido, somente as famílias que sofreram com o luto, até uma das mães dos meninos se suicidou por tristeza profunda. Leitty termina suas rimas mencionando Pedro Paulo, o Mano Brown, e cita os ensinamentos aprendidos pelos raps do Racionais, que marcou a formação pessoal de muitos dos amantes do Rap. Além da referência ao desfile da marca do Emicida na Fashion Week e a questão da representatividade negra.

Garnet inicia sua parte no cypher falando sobre a situação do negro na história, Eva Mitocondrial foi o nome dado ao ancestral comum dos humanos, uma mulher africana. Ao mencionar que a Europa ancestral foi preta por muito tempo, faz menção a história dos homínideos e dos continentes. Garnet faz referência ainda ao transporte dos negros escravizados, da África para o Brasil, e explica através da biologia novamente, através da teoria de Darwin, com a evolução das espécies, o meio vai selecionando os mais adaptados, que vão passando seus genes para as próximas linhagens. Podemos enxergar essa referencia, pela ótica de sermos a resistência, já que desde a eva mitocondrial, ainda seguimos negros no mundo, ou o fato de mesmo após toda matança e genocídio negro que permanece de outras formas até hoje, conseguimos sobreviver. O próximo verso também pode ser visto de duas maneiras, o Homem de aço mencionado pode ser referência a música do grupo DMN, ou somente literalmente o homem de aço, que vai 'meter ferro fácil nos racistas e na anemia'. No racista, obviamente porque, e na anemia, que é uma doença causada pela falta de ferro no organismo. O verso seguinte denuncia a questão dos relacionamentos interraciais (com a maioria, senão todos os casos com abusos psicológicos e sexuais) durante e após a abolição, que resultou nos filhos miscigenados , que contribuiu fortemente para se alimentar a idéia de que não existe racismo no Brasil, já que se 'até me relaciono com negras' como posso ser racista? (rsrs)

O último rapper a rimar no cypher é Rodrigo Buga, exaltando a ancestralidade, Buga começa sua parte referenciando grandes mulheres negras da história, Aqualtune, avó de Zumbi dos Palmares e Dandara, esposa de Zumbi. Ao rimar 'filhos de Aqualtune, filhos de Dandara, mulher preta em nossa história sempre foi sagrada', ele usa a referência e força das mulheres negras através dos tempos. Buga se refere ao termo Odara, usado pra falar sobre algo belo, que significa bom em iorubá, e por isso também a sequência, 'nosso Axé, magia, contagia e vara', referenciando o idioma e as religiões de matriz africana, no contexto das mulheres negras. Continuando a rima, Buga aponta o problema do racismo através da ocultação dos fatos e mentiras contados pelo opressor, ao esconder a história negra e tudo que aconteceu, e contar a sua versão sob a ótica dos privilegiados. O próximo verso faz referência a música negra, Motown é uma gravadora estadunidense que foi responsável por alguns dos maiores nomes da música negra, como Michael Jackson, Stevie Wonder, Marvin Gaye e Diana Ross e Chic Show foi uma das primeiras equipes a organizar eventos de hip-hop no Brasil, ainda na década de 1980. Buga ainda faz referências a personagens negros do entretenimento, como Black McGuyver, Ranger preto e Kamem Ryder. Banzo significa um sentimento de nostalgia que os negros da África têm, quando estão ausentes do seu país, é um termo de origem africana. Banzo significa estar triste, pensativo, atônito, por isso se morrer de banzo, vai virar pesadelo de todos que são responsáveis pelo sentimento. No último verso, Buga brinca com o #somostodostalcoisa, usado muitas vezes por racistas velados pra falar justificar, como ocorreu com o somos todos macacos por exemplo. Buga ressignifica, e dá sentido ao #somostodosMarcusGarvey, dando sentido positivo de sermos todos ativistas, já que Marcus Mosiah Garvey foi um comunicador, empresário e ativista jamaicano. É considerado um dos maiores ativistas da história do movimento negro.

Bom, é isso, minhas percepções como ouvinte de algumas referências utilizadas, pode não condizer com a intenção do autor. Deixem sugestões de músicas nos comentários, e críticas também.


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