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Resenha Beats │ Beatmakers e Produtores e sua representação no Hip Hop. Do que se alimenta a tal cena?


Essa é a estreia da coluna Resenha Beats, onde o Noticiário Periférico pretende trocar ideia com algumas e alguns beatmakers e produtores brasileiros. Antes de dar início as entrevistas, gostaríamos de propor uma reflexão sobre a profissão e como o fortalecimento de uma "cena beatmaker" poderia mudar os rumos do que se consome em termos de Rap e música no geral. Talvez uma rede forte de selos como High Focus, Mellow Music Group, Jamla, Jakarta Records e etc, mudasse além do que se propõe em termos de música para o público nacional, mas também diminuísse a "migalhagem" de quem se propõe a fazer beats, gastar tempo e investimento$ pra vender 4 por 10$ na feira do rolo do Rap. Essas e outras fitas, você confere no texto abaixo.


9th Wonder aborda estudantes de Harvard em uma cena do documentário The Hip-Hop Fellow, que narra um ano em que o produtor passou a ensinar a cultura do hip-hop como um assunto acadêmico. Imagem: Price Films.
Pra começar, utilizando como referência a entrevista da RedBull com o DJ, Beatmaker e Produtor, DJ Duh, gostaria de diferenciar a nomenclatura dos trampos porque nos ajuda também a começar a identificar o quão complexo é trabalhar fazendo música.

DJ - Ao contrário do que muitos dizem, o DJ é um músico, sim. Seus instrumentos são os toca-discos e o mixer, basicamente. Ele utiliza samples, drumbreaks e efeitos sonoros para criar novas tracks. 

Beatmaker - Se assemelha ao DJ porque também utiliza samples de músicas, de bateria, para criar instrumentais para grupos, bandas, MC's. Ele reiventa uma música à partir de um ou vários trechos de músicas já existentes com o seu instrumento, que normalmente é uma MPC ou uma controladora MIDI conectada a um computador.

Produtor - Tem características do DJ e do beatmaker, porém tem mais responsabilidades. Ele tem que dar a cara da música como um todo, cuidar dos arranjos dos músicos orgânicos, do arranjo vocal, a empostação e afinação do cantor, a intenção das notas, o trabalho dinâmico dentro da música. 

O Rhythm Roulette é um quadro do canal Mass Appeal que desafia os produtores a fazer um  beat, sampleando três registros aleatórios, escolhidos de uma loja de discos local enquanto eles estão vendados.

Bom, com essas definições teóricas, gostaria de falar um pouco sobre alguns pontos que refleti e observei em algumas discussões e desabafos com amigos. Se pararmos pra pensar um pouco sobre, os produtores e beatmakers têm sido a personificação do que é o rap de geração em geração. É bem fácil citar nomes, contextualizar a época de início e perceber como algumas características se firmam muito em algumas formas de criar. Porém, o Hip Hop, o Rap precisamente não é um gênero musical imutável, e a Golden Era dos anos 90, considerado o auge, pode ser reinventada, evoluir e acompanhar as mudanças tecnológicas, sociais e tudo mais. 

Muitas dessas mudanças estilísticas vêm na forma de mudanças no conteúdo das letras. Mas tão importante quanto são os beats. O timbre, a energia e os ritmos que impulsionam e definem o tom das faixas. Por causa disso, produtores de beats prolíficos e produtores em ascensão podem ter um efeito importante no que se tem na "cena" como um todo. Se pararmos pra pensar, que a idéia inicial do MC veio pra complementar o show  e arte do DJ. Porque hoje parece que surgem beatmakers aos montes pra servir a MC's? Basicamente perpetuando uma linha de produção de música chata, as vezes arrogante e vazia. O que é que trás a desvalorização da música trabalhada, criativa, pensada? Somente a tecnologia? Ou a ação de servir apenas, não inovar, mas sim produzir "BEAT TIPO DJONGA" também ajuda com que mais e mais pessoas se sintam aptas e confiantes pra comercializar música ruim e impulsionar o mercado hypeano? Que fique bem dito, que música ruim não é música independente, ou as sujeiras que a gente acha interessante. Mas sim as músicas que sonoramente parecem a mesma o álbum todo.

Talvez nunca tenhamos parado pra pensar como isso é também definidor da chamada "cena". Porque por exemplo ainda não damos espaços pra consumir e aplaudir obras de produtores como do baterista baiano Dr. Drumah, que já assinou várias e várias produções pra artistas da cena underground  gringa, fora os discos instrumentais ou de remix; e juntamente com isso, dá pra se pensar como a grande maioria dos artistas em destaque parecem ter frequentado o mesmo SENAI do rap, invisibilizando gente nova que faz som diferenciado, e também nomes como ParteUm e Matéria Prima por exemplo, que são considerados "complexos demais pra ser rap". Porrannnnnnnnn! 


Mas enfim, como então podemos fortalecer a profissão, os corres e tudo mais? Uma das ideias é aumentar por exemplo o fortalecimento e colaborações com iniciativas como a Beat Brasilis. Vocês conhecem?


Uma das edições da Beat Brasilis. Foto: Instagram
Beat Brasilis é um encontro de DJs, músicos, produtores e beatmakers organizado pela Casa Brasilis. Focado em produção musical direcionada ao rap. Toda quarta-feira, a casa abre para um encontro de DJs, músicos, produtores e beatmakers. Consiste em usar samples de um disco à venda na loja e produzir novas faixas. No fim do dia, cada um toca o que acabou de criar, ali mesmo, horas antes.

Segundo uma das fundadoras da Casa, Rafa Jazz, em entrevista ao site Projeto Draft, o projeto “Gera um conteúdo muito legal. A gente acabou criando uma cena de beatmakers, o pessoal estava espalhado por São Paulo e só se encontrava em ambiente de batalha. No Beat Brasilis é o oposto, o clima é de compartilhamento de informações”.


Beat Brasilis Rec é um selo independente derivado do encontro Beat Brasilis. Segundo descrição do próprio portal do selo, o foco é lançar beat tapes ou beat clipes dos beatmakers participantes do encontro. De boom bap a trap, passando pelo trip-hop e lo-fi sempre priorizando a arte do sample.

O formato do lançamento é livre e depende da linguagem de cada artista, mas como a alma da Casa Brasilis é disco todos terão seu trabalho disponibilizados em compactos hi-fi gravados pelo Vinyl-Lab e download liberados no BandCamp. Você pode dar uma conferida aqui

Outras iniciativas pelo mundo ...

Pra falarmos um pouco dos selos que citei na introdução e avaliar como é interessante essa rede de colaboração e trocas entre produtores e beatmakers, vamos conhecer um pouco sobre.


Fundada em 2010 para oferecer uma plataforma para uma nova geração de rappers e produtores no Reino Unido. Com o apoio de todos os principais promotores, distribuidores, revistas e sites de Hip Hop do país, o selo tem um fluxo constante de diversos lançamentos. High Focus tem um objetivo - ressuscitar o legado do Hip Hop inglês. E olha, nomes como The Four Owls, Fliptrix, Leaf Dog, Ocean Wisdom, Verb T, tem nos mostrado que eles tem conseguido o que propõem.  

A Mello Music Group é uma gravadora independente, conhecida por sua originalidade e ampla influência de estilos, construindo uma plataforma de artistas inovadores como Oddisee e Apollo Brown. Desde a sua estreia em 2008, eles continuaram a expandir e trazer trabalhos únicos e criativos para uma base de fãs mundial. Ainda integram a lista de artistas, Quelle Chris, L'Orange, Open Mike Eagle, Chris Orrick, Elaquent, Lando Chill, Mr. Lif, The Lasso, Kool Keith, Georgia Anne Muldrow. 
Jamla Records é o selo comandado pelo produtor 9th Wonder, abrindo espaço pra nomes da sua área (Carolina do Norte) e nomes iniciantes do cenário independente. Conta com nomes como Rapsody, GQ, Khrysis, Nottz, Eric G. entre outros. Os trabalhos podem ser conferidos aqui. Um dos trabalhos que mais gosto é o Jamla is the Squad. Onde o produtor 9th Wonder reuniu um time de peso com nomes como Talib Kweli, Pete Rock, Masta Killah, Styles P, Blu, Elzhi pra colaborações com artistas do selo como Rapsody, Halo, GQ, entre outros. É simplesmente sensacional.
E por fim, mas não menos importante, a Jakarta Records é uma gravadora de Berlim/Cologne, Alemanha. Já lançaram músicas de artistas como Kaytranada, IAMNOBODI, Suff Daddy, Akua Naru, Blitz The Ambassador, Sango, Asagaya, Bluestaeb, Illa J , Ill Camille, Enoq  e muitos mais.

Permuta de Beats na Feira do Rolo.

Olha o biiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiti! É três por dez!!!!
Tá certo que o Rap tem virado pra  algumas pessoas apenas, que contratante não paga o que deve, que fazer música, trabalhando, estudando, fazendo bico, cuidando da tia da vó da irmã, é difícil. Mas pra cobrar como profissionais, é necessário profissionalizar o trabalho. E não necessariamente diz respeito a ter todos os cuidados necessários na indústria da música, como um advogado pra cuidar das questões de direito de música sampleada por exemplo. Mas também na postura. Beatmakers e produtores fornecem beats e instrumentais para outros artistas gravarem em cima. Ao contrário de outros artistas, que vendem sua imagem para o público tanto quanto sua música, os beatmakers e produtores vendem suas músicas para outros artistas, e geralmente não se preocupam com a pessoa ou imagem que estão sendo vistas pelos olhos do público. É importante que os profissionais dessa área se articulem na autonomia que devem ter, de não ser um servidor de MC, mas sim também um artista. Que merece reconhecimento tanto quanto quem grava em suas músicas. 

A produção de um beat é algo custoso, seja pela pesquisa investida, a formação, os equipamentos. Não desvalorizem o trabalho de vocês, pra que não caiam no jogo mercadológico. Na verdade, se você chegar a um ponto de aclamação, as pessoas interessadas em sua marca de beats muitas vezes chegarão até você. 

Mas então, aonde chegamos?

Bom, é bom pensarmos que o Hip Hop não é mais uma criança. Aos 40 anos, é oficialmente de meia-idade, e obviamente iria sentir as divergências geracionais que surgiram com o passar dos anos. Alguns artistas e fãs de rap mais velhos, sentem que sua música era mais significativa, mais digna, do que a música que a galera mais jovens estão tocando, trabalho que os adultos estão descartando como nada mais do que barulho. Isso é um extremismo bobo, porque tem música boa em muitos espaços. Porém, o que estamos fazendo pra que ela permaneça viva? No último som do Rashid, Kamau e Spvic, "A Proposta", Kamau em seus versos diz: "Sinto que minto se faço que o vende-se, lança todo mês, plays um milhão de vez, Sei ... que amor não paga conta e às vez é tanta, que pra garantir  a janta a gente faz igual o que outro fez?". E é um pouco do que queria propor como reflexão. Pra iniciar esse espaço, que pretendemos ser uma troca de ideias, é importante começarmos a refletir e pensar sobre a arte que fazemos, seja quaisquer que sejam elas.

Paz!







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