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Reggaeton: Origem, marginalização, sucesso mundial e embranquecimento

Da esquerda pra direita: Tego Calderon, La Sista, Daddy Yankee, J Balvin, Becky G e Karol G

De 2004, com o mega sucesso de “Gasolina” do Daddy Yankee, até meados de 2010, o Reggaeton esteve nas principais colocações das paradas musicais. Com remixes, colaborações entre os artistas de outros gêneros e tudo mais.

O ritmo nunca deixou de ser feito, mas esteve por um período em baixa a ponto dos principais nomes como Daddy Yankee, Don Omar, Wisin & Yandel e outros evitarem dizer que faziam só Reggaeton, mas por estratégia de mercado eles diziam que faziam “Música Urbana”. No momento estou lendo um livro chamado “Os Colombianos” (autor: Andrew Traumann), onde conta a história do país, desde os povos originários, colonização, café, música e afins. No Capitulo música, o autor destaca que o país foi o grande responsável pela volta do Reggaeton nas principais paradas da música Pop. Mas vamos ver como tudo começou, se desenvolveu e de que modo ele chega no mainstream.

Bandeira do Panamá e Porto Rico

Origem

Antes de ganhar o nome de Reggaeton, o ritmo era diferente e era chamado de “Español Reggae”. Ele ganhou esse nome a princípio, pois além do Reggae chegar pelas ondas do Rádio, que foi e é um circuito de comunicação em massa que são ótimas redes diaspóricas, que popularizou a musica jamaicana em lugares como Panamá, Porto Rico, Maranhão no Brasil e em mais alguns países ao norte de nosso país. O Panamá foi de fato o primeiro país a popularizar o tal “Reggae em Espanhol” e assim percorrendo toda a América Central.

Desde que muitos jamaicanos foram trabalhar na construção do canal do Panamá, isso no inicio do século 20, os afro-panamenhos numa troca cultural começaram a gravar o reggae jamaicano em espanhol. Além de muitos jamaicanos que acabaram por residir no Panamá também começaram a compor em espanhol.

Artistas como El General, Chichoman e Apache Preto são considerados os primeiros DJs do Panamá a tocar e cantar o Espanhol Reggae. El General é muitas vezes considerado o pai do reggae em espanhol, misturando reggae jamaicano com uma versão latinizada. Era uma prática comum traduzir as letras do reggae jamaicano para o espanhol e cantá-las em cima das melodias originais.

Entretanto, na década de 80 o porto-riquenho Vico C lançou alguns sons que misturava o reggae em espanhol com rap e elementos de música de sua terra natal. Suas músicas em fitas cassetes durante a década de 80, já com esta mistura ajudaram muito na propagação do ritmo que no fim dos anos 90 começou a se chamar Reggaeton.

Em Porto Rico, foi onde o “Reggae em Espanhol”, bateu forte e a juventude abraçou essa vertente musical. Vale ressaltar que Porto Rico é uma espécie de colônia do Estados Unidos desde o século 19. Antes a ilha pertencia a Espanha, mas num embate entre Estados Unidos e Espanha, o pais europeu deu a colônia de Porto Rico a terra do Tio Sam. (O canal Vogalizando a história tem um vídeo bem legal sobre - A RELAÇÃO ENTRE OS ESTADOS UNIDOS E PORTO RICO) Inclusive em 2020, 52,34% dos eleitores porto-riquenhos votaram para que Porto Rico se tornasse um estado do Estados Unidos

É um bagulho extenso e complexo, mas resumi a isso para dizer que a cultura estadunidense é muito presente na ilha.  Os porto-riquenhos tem livre acesso ao EUA, portanto muitos porto-riquenhos quando voltavam traziam muita música de Nova York e foi só questão de tempo para que a música de quebrada de Porto Rico tivesse essa influencia. Então em meio ao Reggae em Espanhol, ritmos afro-latinos + o rap e a cultura Hip-Hop, fizeram com que os porto-riquenhos passassem a produzir seus próprios “Riddims”.

Após a fase do “Reggae em Espanhol” e Porto Rico começa a dar cara a esse gênero musical, ele começou a ser chamado de “sob”, com mistura de rap, reggae e dancehall, o também conhecido como “Boricua Rap Underground” serviu como uma expressão musical e de vida para milhões de jovens.

Isso criou toda uma jovem cultura que ainda era proeminente e underground que procurou se expressar através de “Reggae Rap em espanhol”. Como uma cultura que existe à margem da sociedade e da ilegalidade penal, tendo sido muitas vezes criticada publicamente. 

Algumas capas de álbum ou mixtapes

Marginalização

A policia porto-riquenha bateu forte no ritmo que passou a ser chamado de “Underground”, justamente por ser algo que era tocado no subterrâneo, a margem da sociedade convencional e conservadora.  A polícia saía confiscando as fitas cassete de lojas de música, se baseando nos códigos penais de obscenidade, emitindo multas e usando os meios de comunicação para desmoralizar os rappers.  

Em San Juan, o "underground", no entanto, não foi apenas sobre a autenticidade ou ideologia, mas foi literalmente, sobre a posição no mercado. A música "Underground" foi distribuída através de redes informais, copiados de cassete para cassete, até meados de 1990.

O DJ Playero foi um dos produtores mais famosos do "underground" no momento liberando vários cassetes informais que contou com apresentações iniciais de alguns artistas como Daddy Yankee. A base para o Reggaeton foi colocado em Porto Rico, neste momento, com a fusão de Espanhol Reggae, com influências de Dancehalls rápidos, rap e vários outros gêneros musicais afro-latinos.

Playero 36 (TAPE) (1992) |  

Traclist: Daddy Yankee & Apache, Party Break (Gringo + Cutty Ranks), Apache, Party Break (Papa San + Bobo General), Lisa M, Blanco Flake, Daddy Yankee, Apache, Ranking Stone, Third World Underground (Blanco, Maicol & Manuel), Falo, JamalSki - Medallion Masters Human Beat, Red Fox - Dem a Murder, Papa San - Makoosa, Nardo Ranks - Rump Shaker, Cutty Ranks - Hustle Hustle, General Degree - Love Lullabye, Ricky General, Party Break, Cutty Ranks - As You See It You Dead, Vico C - Paren El Fuego, Shinehead - Jamaican in New York, Cutty Ranks - Limb by Limb, Nando Boom - Enfermo de Amor, JamalSki - Roughneck Intro, Nando Boom - El Mazo, Party Break, Patra - Queen of the Pack, Simpleton - Big Fat gal, Party Break, Dr. Mic.

O gênero ainda denominado de “Underground”, se transformou ao longo dos anos e por um curto tempo passou a ser denominado de "Melaza" e "Dem Bow". Este último nome é de onde o Reggaeton ficou caracterizado. O loop do Dem Bow é uma marca mais que característica em 90% do Reggaeton lançado até hoje (2022). O Riddin foi produzido sob a direção do produtor jamaicano Bobby "Digital" Dixon e executada por Steely & Clevie.

Ele se tornou popular na canção "Dem Bow" interpretada pelo artista de dancehall jamaicano Shabba Ranks, em 1991. A música e a batida alcançaram maior popularidade entre os de língua espanhola, latino-americanos, quando o artista panamenho, El General lançou a música "Son Bow", em 1991, nada mais que uma tradução usando o mesmo beat. Lembrando que nem Shabba ou El General cantaram reggaeton, já que nem o gênero, nem seu título ainda havia se formado. Além disso, "Dem Bow" foi apenas uma canção única no catálogo Shabba. No entanto, a influência da batida original de Bobby "Digital" é inegável, e frequentemente ainda reflete no reggaeton moderno a instrumentação inicial, bem como a sua estrutura original e rítmica.

Ainda conhecido vulgarmente como “underground”, as letras ainda eram bem explicitas falando sobre drogas, violência, pobreza, com letras homofóbicas, machistas, de amizade, amor e sexo. Eram temas comuns, que retratava os problemas de uma vida no interior do país, que ainda pode ser encontrado no reggaeton atualmente. Sendo gravado em “marquesinhas” (garagens abertas) e distribuído nas quebradas através de fitas cassetes, as marquesinhas foram essenciais para o desenvolvimento do até então underground e hoje reggaeton de Porto Rico, pois seus ouvintes e artistas tinha medo de perder a liberdade de cantar. Marquesinas também era por muitas vezes conjuntos habitacionais criado pelo governo como Villa Kennedy e Jurutungo.

Apesar de ter sido gravado nos conjuntos habitacionais de Porto Rico, a maioria das gravações feitas em marquesinas eram de alta qualidade, o que ajudou a aumentar sua popularidade com os jovens porto-riquenhos, não só com a quebrada, mas com os da classe média e alta também. A disponibilidade e qualidade desses cassetes levaram a popularidade do gênero, atravessando barreiras socioeconômicas da cena musical porto-riquenha. Os cassetes mais populares no início dos anos 1990 foram DJ Negro The Noise I e II, e DJ Playero  #37 e #38. Gerardo Cruet que ajudou essas gravações espalhar o gênero das áreas marginalizadas residenciais em outros setores da sociedade, principalmente nas escolas privadas.

O até então “underground”, enfrentou duras criticas em Porto Rico, nos anos 90. Em 1995, o governo porto-riquenho patrocinou uma campanha de peso contra o gênero. A polícia do país lançou aproximadamente 6 ataques em lojas de discos em San Juan, onde centenas de fitas cassetes foram confiscadas e foram impostas multas de acordo com as leis 112 e 117, que são contra a obscenidade.

O Departamento de Educação proibiu qualquer roupa folgada, rap e o underground dentro do sistema de ensino. Nos meses seguintes, após os ataques, a mídia local demonizava os rappers, alegando que eles eram "irresponsáveis e corruptores da ordem pública". No mesmo ano, DJ Negro lançou o álbum The Noise 3, com letras socialmente aceitas pelo governo, com exceção da última faixa.

O álbum foi um sucesso e o underground cada vez mais se consolidava. Nas real mesmo, essas fitas do governo só ajudou a popularizar o gênero. Sabe aquela fita de curioso? Tipo: “Xô ver o que o governo tá querendo que eu não ouça”. 

The Noise 3 - Clean Lyrics (1993)

Tracklist: 01-Intro, 02-Baby Rasta & Gringo - Cierra Los Ojos, 03-Polaco & Prieto - Yale, 04-Party Baby - Mujer, 05-Bebe - Nena, 06-Point Breakers - Su Vida Se Encuentra En La Calle, 07-Las Guanabanas - Amigo, 08-Memo & Vale - Siete Días, 09-Baby - A Donde Fue El Amor Que Prometiste, 10-Manec - Busco, 11-Chapo & Cano D, Master, Mr. Biggie & Baby Rank, Nestito (Street Clan People), Apache & New Creation - Little Boys e 12-Tony Touch - Outro

O Senador Velda González do Partido Popular Democrático e os meios de comunicação continuaram a ver o movimento como um incômodo social. 

Já em 2002, quando o gênero já se consolida como Reggaeton, o senador Velda González levou audiências públicas na tentativa de regulamentar a "negligência" sexual das letras do reggaeton e do estilo de dança perreo associado com o gênero. Após muita luta no passado, o Reggaeton, lentamente, começou a ganhar aceitação como uma parte importante da cultura porto-riquenha, ajudado em parte por políticos, incluindo Velda González, que usou o Reggaeton nas campanhas eleitorais para atrair os eleitores mais jovens, a partir de 2003. 

Reggaeton expandiu e tornou-se conhecido quando outros produtores seguiram os passos do DJ Playero, como DJ Nelson e Eric DJ. No início dos anos 90, álbuns de Ivy Queen, “En Mi Imperio” em 1996, DJ Playero 's Playero 37 (em que Daddy Yankee ficou conhecido) e The Noise: Underground, The Noise 5 e The Noise 6 eram muito populares em Porto Rico e República Dominicana. Cantores como Don Chezina, Joe Master & Preto OG , Rasta Baby & Gringo, Lito e Polaco eram muito populares.

Shakira e Maluma

Colômbia se torna a capital mundial do Reggaeton e junto se reforça o embranquecimento do gênero criado nas quebradas do Panamá e Porto Rico

Dom Omar, Ivy Queen, Tego Calderon, Glory, Daddy Yankee, Hector El Father, Wisin & Yandel, La Sista, os produtores Luny Tunes e muitos outros foram os responsáveis pela popularização e ida do Reggaeton para o mainstream. Tendo como o hit “Gasolina” de Daddy Yankee como o carro chefe. Mas não se pode deixar de falar de “Pobre Diabla” e “Reggaeton Latino” de Dom Omar, que são hinos do estilo mais underground do gênero, "Rakata" e “Dembow” da dupla Wisin & Yandel, “Oy Mi Canto” do rapper N.O.R.E, “Play That Song” do Tony Touch e muitos outros ajudaram ao ritmo se consolidar no mainstream.  Até meados de 2010 o Reggaeton seguiu lançando Hits, mas como naquele tempo para bater no mundo todo teria que fazer sucesso no Estados Unidos ou Europa, com o Reggaeton saturado no mercado, os artistas mais populares do Reggaeton tentaram se desvincular como um reggaetonero, mas se consolidando como um artista pop mundial, vide o Dom Omar que teve um real sucesso mundial em “Danza Kuduro”, de 2010.

Pulando para 2017, o single “Despacito” de Luis Fonsi e Daddy Yankee foi o grande responsável por trazer o Reggaeton de volta as paradas musicais. Com mais de 7 bilhões de views no Youtube, o single é um marco dentro do gênero. "Despacito" foi produzido pelos colombianos Andrés Torres e Mauricio Rengifo. Esse sucesso chancelou a volta do gênero que já estava bombando na Colômbia e foi só questão de tempo para o país ter os artistas mais escutados do gênero. Maluma, Karol G e J Balvin são os grandes expoentes pop/reggaeton da Colômbia. 

Durante o período em que o Reggaeton de Porto Rico esteve em baixa, em meados de 2010, a Colômbia, mais especificamente em Medelin e Cali o gênero era um sucesso a ponto de vários reggaetoneros porto-riquenhos abrirem mão de seu orgulho nacionalista e irem para a Colômbia trabalhar com artistas e produtores do gênero. Assim dando uma oxigenada em seu som. Em 2015 o país sul americano já se consolidava como a capital mundial do Reggaeton, e foi exatamente neste ano que o J Balvin lançou o seu sucesso “Ginza”. Sucesso que ganhou um remix com participação da Anitta em 2016. A artista brasileira desde então fez algumas apostas no gênero e recentemente seu single "Envolver" alcançou o topo das paradas dentro do Spotify.

J Balvin teve clipe excluído do Youtube por colocar duas mulheres negras como cachorras em coleiras e corrente em seu clipe de "Perra"

Sexismo, machismo e embranquecimento

Se você chegou até aqui já entendeu que o Reggaeton bebeu de todas as fontes afro em que ela teve contato, certo? Mas como de 2015 pra cá a cena Reggaeton fica majoritariamente branca? Sou fã de Reggaeton desde Gasolina até o ritmo ficar saturado e não obter mais noticias de lançamentos. Com essa volta do Reggaeton resolvi revisitar um artigo em que eu havia escrito por volta de 2008 ou 2009. Daí então tive a ideia de relançar ele atualizando as informações. Após uma leitura do livro “Os Colombianos” e voltar a estudar o gênero recuperando o tempo perdido e me atualizando, me deparo com uma enxurrada de artista branco dominando as paradas musicais do Reggaeton. Não que antes não havia brancos reggaetoneros, mas pretos e os ditos morenos (pra nós pardo ou mulato) dominavam a cena mainstream e underground. 

J Balvin é o maior nome do gênero atualmente e ano passado meteu uma ideia de que não se sentia representado pelo gênero por ser composta por uma maioria negra. Confira:

“Quando escutei Daddy Yankee eu pensava que ele era afro, mais ou menos como Tego Calderon. Normalmente, o Hip-Hop sempre foi mais reconhecido por ser de afro-americanos, inclusive o reggaeton quando começou, o ragga, a maioria também eram morenos ou negros. Quando eu vi pela primeira vez a imagem do Daddy Yankee disse: “Ah, eu posso ser como ele!”

“Como eu vi que já se abriu um caminho, vi que Yankee era branco, um latino, como eu. Com isso, comecei a ver que podia entrar dentro da estética. Vi uma esperança de poder pertencer e aí já acreditei no filme. Eu o copiava em tudo. Eu era como “Eu me chamo Daddy Yankee” quando comecei, até que me dei conta que Daddy Yankee só teria um. Então disse: bom, tenho que criar o J Balvin", disse o cantor durante a entrevista para o jornal El Tiempo.

Não da pra saber a intenção dessa declaração sem ter assistido como ele entonou essa fala, mas essa declaração pegou muito mal entre os reggaetoneros, principalmente entre a comunidade negra dentro do gênero.

Houve também o episódio onde o cantor colombiano teve que remover o videoclipe de sua canção “Perra”, no qual passeava com uma mulher negra com uma coleira de cachorro e mesmo assim ganhou um premio como o melhor cantor afro-latino (MESMO SENDO BRANCO...RSRSRS) do ano de 2021 segundo a AEMA (African Entertainment Music Awards)

Citei esse caso do J Balvin, mas há outros relatos e letras bem problemáticas dentro do gênero. Atualmente muitos artistas tem mudado suas letras e se adequando ao novo momento.

O número de mulheres em destaque no Reggaeton é esmagadoramente menor, já que o Reggaeton é um reflexo da sociedade, não tem como ele não ser machista e sexista. Porém quando se pesquisa sobre as mulheres no Reggaeton é como se as cantoras fossem espanholas. Todas as listas pesquisadas, somente 4/5 mulheres negras aparecem e são: La Sista, Ivy Queen, Glovy e dupla panamenha La Factoría.

 

As artistas negras citadas já estão a um bom tempo sem lançar sons novos, enquanto isso, a indústria musical fomenta artistas como Shakira, Thália, Karol G, K-Narias, Natti Natasha, Becky G, Anitta e outras. E eu não estou desmerecendo o trampo das minas, pois elas falam muito de empoderamento e liberdade do corpo em suas letras. 

Mas não se pode negar que a indústria musical usa da imagem padrão delas e as impulsionam e as promovem como os grandes nomes do Reggaeton. Porem quando mulheres negras com um trampo independente canta músicas assim a sociedade vê suas letras como vulgar. 

Negros no Reggaeton hoje e em dia são figurantes de clipes, os artistas vão nas quebradas impor aquela estética de inclusão e humildade. Tudo faixada. Em “Despacito” por exemplo o clipe é gravado no gueto, Daddy Yankee um moreno/pardo (pele clara), Luis Fonsi um homem branco perfomam em meio a diversidade cultural e étnica, onde a mulher branca é o objeto de desejo. 

Escrito por Priya Kaler, o artigo Reggaeton: a whitewashed genre, numa tradução bem livre seria: Reggaeton: um gênero pintado de branco. Num determinado momento cita o fato de que o embranquecimento no Reggaeton se deve ao fato do ritmo furar a bolha da América Latina e ir para o mercado estadunidense e europeu. No sentido de que a indústria visando o dinheiro e a aceitação de seus artistas resolveu apostar em novos talentos brancos. 

Dentro desse artigo, é citado uma entrevista do Theatlantic.com com a Rivera-Rideau, autora do livro “Remixing Reggaeton: The Cultural Politics of Race in Puerto Rico” que dá uma visão bem interessante sobre o que estamos tratando. 

Num determinado momento da entrevista, o jornalista Spencer Kornhaber pergunta: Seu livro é parcialmente sobre a dinâmica racial no Reggaeton. Você pode falar um pouco sobre isso?

Se liga neste trecho da resposta:

“Não teríamos o reggaeton se não tivéssemos padrões históricos complicados de migração na bacia do Caribe. Uma ideia muito básica de quais ingredientes produzia o reggaeton seria o hip-hop vindo dos EUA, o dancehall baseado na Jamaica e um tipo de música chamado reggae en español do Panamá em particular. Há um debate sobre as origens: os porto-riquenhos faziam reggaeton ou os panamenhos faziam reggaeton? Uma das coisas que une todas essas coisas é que muitas dessas músicas vêm de comunidades urbanas, predominantemente negras, da classe trabalhadora – sejam elas de Kingston, Cidade do Panamá, Nova York ou San Juan.

Meu livro fala especificamente sobre o contexto porto-riquenho. Em Porto Rico, há uma sensação de que a trindade de raças da ilha – negra, espanhola e indígena – produziu uma sociedade harmoniosa sem racismo. Mas quando você olha para coisas como quem tem acesso à educação, ou a segregação habitacional, fica muito claro que os afro-porto-riquenhos são discriminados. O Reggaeton proporcionou um espaço para falar sobre essas questões. Tego Calderón, que foi realmente a pessoa que trouxe o reggaeton para o mainstream em Porto Rico antes de “Gasolina”, tem uma música chamada “Loíza” na qual fala sobre o racismo institucional em Porto Rico. Eddie Dee escreveu músicas sobre a discriminação que enfrentou como rapper e como alguém de ascendência africana.

 

Ao mesmo tempo, a história do surgimento do reggaeton em Porto Rico também expõe a persistência do racismo anti-negro por lá. Em Porto Rico, o reggaeton estava ligado a empreendimentos de habitação pública que nos anos 90 faziam parte de uma iniciativa anticrime chamada Mano Dura Contra el Crimen, liderada pelo então governador Pedro Rosselló. O discurso em torno da campanha foi fortemente racializado: homens jovens, predominantemente não brancos, eram vistos como perpetradores de crimes. Ao mesmo tempo em que isso começou a acontecer, o reggaeton foi se tornando mais popular. Crime e drogas, que foram os temas que deram a chamada justificativa de Mano Dura, passaram a ser atribuídos a cantores e fãs de reggaeton. Tornou-se uma música muito difamada. Em meados da década de 1990, a polícia porto-riquenha entrou em shoppings e pegou gravações de reggaeton e tentou acusar os donos das lojas de vender obscenidades, e isso foi descartado pelos tribunais. Ao mesmo tempo, quando o governo mirou o reggaeton, ele ganhou publicidade: pessoas que não tinham ouvido falar dele começaram a ouvir falar dele, o que ensinou aos artistas que poderia haver um mercado maior para eles do que eles pensavam originalmente.”

Conclusão:

Não importa o país, o sistema é sempre o mesmo:

Marginaliza, não consegue, tenta proibir, não consegue. O bagulho populariza e o que as grandes corporações fazem? 

“Ok, vamos investir neste gênero, mas vamos dar a nossa cara”

Então eles fazem o que? Embranquece. Assim tentam fazer com o Samba, fizeram com Rock, Funk BR, Rap, Reggae, Reggaeton e por aí vai. 

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Fontes: 

‘Despacito’ and the Revenge of Reggaeton | https://www.theatlantic.com/entertainment/archive/2017/05/despacito/527403/

Reggaeton: a whitewashed genre | https://www.varsity.co.uk/music/19564 

J Balvin: O melhor artista “afro-latino” do ano? | https://g7.news/entretenimento/2021/12/28/j-balvin-o-melhor-artista-afro-latino-do-ano-2

Sete nomes do Reggaeton Feminino para Conhecer DO https://www.latinpopbrasil.com.br/mais/listas/sete-nomes-do-reggaeton-feminino-para-conhecer/

J Balvin fala sobre cantores de reggaeton: “A maioria eram morenos ou negros” https://observatoriodemusica.uol.com.br/noticia/j-balvin-fala-sobre-cantores-de-reggaeton-a-maioria-eram-morenos-ou-negros

História do Reggaeton | https://www.youtube.com/playlist?list=PL5GiJgQNTZhBsao5mCgZn8ywignG_ccjb

Como a batida do reggaeton invadiu o pop do século 21 https://www.nexojornal.com.br/podcast/2021/04/01/Como-a-batida-do-reggaeton-invadiu-o-pop-do-s%C3%A9culo-21#:~:text=O%20reggaeton%20%C3%A9%20um%20g%C3%AAnero,latina%2C%20hip%20hop%20e%20dancehall.


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